Que importa que nos vençam desenganos
Se pudermos contar os nossos anos
Assim como degraus duma subida?
Florbela Espanca
a
Se pudermos contar os nossos anos
Assim como degraus duma subida?
Florbela Espanca
a
20 de Maio de 2006
Em tarde de 50º aniversário da sua inauguração, o Ginásio-Sede teve cerca de centena e meia de presenças, numa cerimónia que decorreu com bom gosto e dignidade mas, em minha opinião, muito aquém do que merecia tão relevante momento da história do FCB.
Logo no início de 2006, em reunião de Direcção, sugeri a necessidade e a premência de constituição de uma comissão organizadora das comemorações. E disponibilizei-me para a integrar. Não vi da parte do Presidente grande entusiasmo pela ideia que formulara. Ainda voltei a levantar a questão por uma segunda vez, mas com igual retorno.
Como em tantos outros aspectos da vida do clube, Manuel Lopes entendeu depositar nas suas mãos a responsabilidade e a quase totalidade das tarefas organizativas da Sessão Solene comemorativa do 50º aniversário do Ginásio-Sede. Carlos Silva Pais, fiel e inteligente depositário de um valioso espólio herdado de seu pai, Armando da Silva Pais – Presidente da Direcção e da Assembleia-Geral do FCB na década de 50 – deu uma preciosa colaboração. Disponibilizando um vasto conjunto de documentos, que serviu para uma exposição que se prolongou por alguns dias no Ginásio-Sede e que foi depois possível apreciar na Galeria Municipal de Arte. Apesar deste meu desalento pelo seu comportamento solitário e auto-suficiente, dei os parabéns a Manuel Lopes pelo trabalho realizado. Podíamos ter sido mais abrangentes e ambiciosos, mas...
Poucos dias antes, escrevera em Rostos um texto de apelo à participação dos meus consócios, e de evocação da grande epopeia que constituiu a edificação do Ginásio-Sede.
a
Sábado, eu vou lá estar
Corria o ano de 1956…
Na Europa, o XX Congresso do PCUS, assistia à corajosa denúncia dos crimes de Staline. Ventos libertadores sopravam na Polónia e na Hungria, mas foram brutalmente reprimidos por tropas do Pacto de Varsóvia. O Portugal de Craveiro Lopes e Salazar seguia triste, atrasado e inculto, ignorado e votado ao ostracismo pelas nações livres do Ocidente democrático. No Barreiro, vila operária de ricas e profundas tradições associativas e de luta pela Liberdade, o seu clube mais pujante, representativo e popular, o Futebol Clube Barreirense, inaugurou a 20 de Maio o seu mítico e grandioso Ginásio-Sede. Quinze anos antes, em 22 de Outubro de 1941, o designado “Movimento Pró-Sede” procedera à aquisição (5$10/m2) de um terreno de 1.512m2, colocado em hasta pública pela Câmara Municipal do Barreiro e arrematado por Albino José de Macedo em nome do Futebol Clube Barreirense, então presidido por Jacinto Nicola Covacich. Em 8 de Maio de 1947 efectuou-se o assentamento da primeira pedra e em 27 de Agosto de 1949 começou a encher-se o primeiro cabouco. Sob a orientação de António Balseiro Fragata (Presidente da Comissão Administrativa do Ginásio-Sede), esta obra, ímpar no panorama desportivo nacional e avaliada em 2400 contos, beneficiou da contribuição de diversos subsídios oficiais, nomeadamente do Ministério das Obras Públicas (550 contos), Ministério da Educação Nacional (80 contos), Câmara Municipal do Barreiro (30 contos) e Governo Civil de Lisboa (15 contos).
Mas a sua enorme riqueza e singularidade resultou, para além do contributo gracioso do autor do projecto (Manuel Nunes Machado) e dos técnicos responsáveis (Luís Raimundo dos Santos, João da Luz, Luís Alberto Figueiredo do Vale, Leonardo de Carvalho, Luís Carvalho da Costa e Jorge Feio), do trabalho voluntário de centenas de Barreirenses que, em horário pós-laboral e aos fins-de-semana, ergueram o edifício com um empenhamento, dedicação, zelo e competência inigualáveis. A cedência de materiais de construção, de invulgar qualidade e bom gosto, viabilizou e deu excelência à primeira obra do género em Portugal. A realização de espectáculos, sorteios (automóvel, vivenda, etc.) e concursos, o recurso a cotizações e donativos de sócios e simpatizantes, constituíram também formas criativas e generosas de um imprescindível suporte financeiro à construção do Ginásio-Sede.
A manhã de 20 de Maio de 1956 nasceu chuvosa, mas a tarde desse inesquecível domingo virou solarenga e primaveril, associando-se alegremente às distintas e nobres cerimónias de inauguração do Ginásio-Sede. Desde Coina, um imenso cortejo percorreu o Concelho, saudou e foi emocionadamente ovacionado pela sua população. Ilustres personalidades nacionais, com realce para o Ministro da Educação Nacional e o Director Geral dos Desportos, associaram-se a diversas entidades concelhias e distritais, nomeadamente o Governador Civil de Setúbal, o Presidente da Câmara Municipal do Barreiro e o Provedor da Santa Casa da Misericórdia. António Balseiro Fragata procedeu à entrega das chaves do edifício ao Presidente do Futebol Clube Barreirense, Armando da Silva Pais, acompanhado de outros dirigentes, entre os quais Jacinto Nicola Covacich (Presidente da Assembleia Geral) e Francisco Pereira Mendes (Presidente do Conselho Consultivo e de Contas). Sobrelotado de adeptos transbordantes de emoção e alegria, o Ginásio-Sede abriu finalmente as suas portas, ao serviço do Desporto e da Cultura Barreirense, prenúncio de uma história de constantes e inolvidáveis momentos de afirmação desportiva e cívica.
O saudoso jornalista Barreirense Alfredo Zarcos foi indiscutivelmente o mais brilhante e consequente divulgador da heróica construção do Ginásio-Sede. Os seus relatos dos inesquecíveis Comboios da Pedra são testemunhos emocionados, arrebatadores e empolgantes da epopeia mais grandiosa da história do Futebol Clube Barreirense. Na edição de 24 de Maio de 1956, com a sua assinatura, podia ler-se no Jornal do Barreiro: “ Ao cabo de quase sete anos da mais canseirosa, da mais esforçada, da mais heróica cruzada, de tantas que o Barreiro é rico de exemplos, inaugurou-se o maravilhoso Ginásio-Sede do Futebol Clube Barreirense, lar imenso do popular e prestigiado clube da nossa terra (...). Agora tudo é já realidade, facto consumado. Certeza também o era há muito, desde o dia em que os primeiros esforços das gentes Barreirenses abriram, largas e profundas, as fundações de onde começaram surgindo para a luz das grandes realizações, as paredes poderosas desse sonhado lar, tão fortes, tão resistentes, como a vontade rubra que dominava os seus obreiros (...). Está em festa o Barreirense! ”
No próximo sábado, no cinquentenário da sua inauguração, eu quero estar presente no Ginásio-Sede do meu querido Futebol Clube Barreirense. Para honrar a obra e a memória de todos quantos souberam concretizar um sonho lindo, erguer uma obra que tanto orgulha o Barreiro e os Barreirenses. Sei que a alegria e a emoção estarão presentes em todos nós, que as lágrimas escorrerão dos meus e de muitos outros olhos. Nós, Barreirenses, somos assim: emotivos, apaixonados, vibrantes. Assim temos feito História. E assim queremos continuar a Ser.
a
Entre os presentes na cerimónia destacou-se, embora já debilitada, a poetisa Maria Helena Bota Guerreiro, que veio a falecer em Fevereiro do ano seguinte. A D. Maria Helena, “emérita trovadora do F. C. Barreirense” (Carlos Silva Pais, Prefácio do livro Giesta em Flor, 2007), brindou-nos com a leitura, sentida e arrebatada, de um magnífico poema alusivo à efeméride.
Foi com ela que aprendi a gostar de poesia, embora não seja, ainda hoje, o meu género literário predilecto. Lembro-me que, quando da publicação em 23 de Outubro de 1967 do livro Brisas e Nortadas, Maria Helena presenteou a minha mãe com um exemplar que li e reli, sempre com muito agrado. Em sua memória, e também de ‘Abril’, permito-me transcrever um poema de sua autoria, que muito recentemente descobri na Biblioteca Municipal do Barreiro, ao folhear o seu segundo livro Poemas do Meu Horizonte, publicado em 1980:
a
1º de Maio de 1974
O dia amanheceu de sol radioso
Nas almas, corações, na natureza.
Tudo foi alegria e tal beleza
Que eu nunca vi um dia tão formoso!
O gesto fraternal e generoso
Surgiu na amplitude da grandeza.
Por toda a parte o riso e a gentileza
Nesse dia de Maio maravilhoso.
Deitámos fora os preconceitos velhos
Sorriso lindo o dos cravos vermelhos!
Que encantadora essa alegria sã!
Bendito o dia do trabalhador!
Lutemos hora a hora com amor
Pla liberdade e paz do Amanhã!
Em tarde de 50º aniversário da sua inauguração, o Ginásio-Sede teve cerca de centena e meia de presenças, numa cerimónia que decorreu com bom gosto e dignidade mas, em minha opinião, muito aquém do que merecia tão relevante momento da história do FCB.
Logo no início de 2006, em reunião de Direcção, sugeri a necessidade e a premência de constituição de uma comissão organizadora das comemorações. E disponibilizei-me para a integrar. Não vi da parte do Presidente grande entusiasmo pela ideia que formulara. Ainda voltei a levantar a questão por uma segunda vez, mas com igual retorno.
Como em tantos outros aspectos da vida do clube, Manuel Lopes entendeu depositar nas suas mãos a responsabilidade e a quase totalidade das tarefas organizativas da Sessão Solene comemorativa do 50º aniversário do Ginásio-Sede. Carlos Silva Pais, fiel e inteligente depositário de um valioso espólio herdado de seu pai, Armando da Silva Pais – Presidente da Direcção e da Assembleia-Geral do FCB na década de 50 – deu uma preciosa colaboração. Disponibilizando um vasto conjunto de documentos, que serviu para uma exposição que se prolongou por alguns dias no Ginásio-Sede e que foi depois possível apreciar na Galeria Municipal de Arte. Apesar deste meu desalento pelo seu comportamento solitário e auto-suficiente, dei os parabéns a Manuel Lopes pelo trabalho realizado. Podíamos ter sido mais abrangentes e ambiciosos, mas...
Poucos dias antes, escrevera em Rostos um texto de apelo à participação dos meus consócios, e de evocação da grande epopeia que constituiu a edificação do Ginásio-Sede.
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Sábado, eu vou lá estar
Corria o ano de 1956…
Na Europa, o XX Congresso do PCUS, assistia à corajosa denúncia dos crimes de Staline. Ventos libertadores sopravam na Polónia e na Hungria, mas foram brutalmente reprimidos por tropas do Pacto de Varsóvia. O Portugal de Craveiro Lopes e Salazar seguia triste, atrasado e inculto, ignorado e votado ao ostracismo pelas nações livres do Ocidente democrático. No Barreiro, vila operária de ricas e profundas tradições associativas e de luta pela Liberdade, o seu clube mais pujante, representativo e popular, o Futebol Clube Barreirense, inaugurou a 20 de Maio o seu mítico e grandioso Ginásio-Sede. Quinze anos antes, em 22 de Outubro de 1941, o designado “Movimento Pró-Sede” procedera à aquisição (5$10/m2) de um terreno de 1.512m2, colocado em hasta pública pela Câmara Municipal do Barreiro e arrematado por Albino José de Macedo em nome do Futebol Clube Barreirense, então presidido por Jacinto Nicola Covacich. Em 8 de Maio de 1947 efectuou-se o assentamento da primeira pedra e em 27 de Agosto de 1949 começou a encher-se o primeiro cabouco. Sob a orientação de António Balseiro Fragata (Presidente da Comissão Administrativa do Ginásio-Sede), esta obra, ímpar no panorama desportivo nacional e avaliada em 2400 contos, beneficiou da contribuição de diversos subsídios oficiais, nomeadamente do Ministério das Obras Públicas (550 contos), Ministério da Educação Nacional (80 contos), Câmara Municipal do Barreiro (30 contos) e Governo Civil de Lisboa (15 contos).
Mas a sua enorme riqueza e singularidade resultou, para além do contributo gracioso do autor do projecto (Manuel Nunes Machado) e dos técnicos responsáveis (Luís Raimundo dos Santos, João da Luz, Luís Alberto Figueiredo do Vale, Leonardo de Carvalho, Luís Carvalho da Costa e Jorge Feio), do trabalho voluntário de centenas de Barreirenses que, em horário pós-laboral e aos fins-de-semana, ergueram o edifício com um empenhamento, dedicação, zelo e competência inigualáveis. A cedência de materiais de construção, de invulgar qualidade e bom gosto, viabilizou e deu excelência à primeira obra do género em Portugal. A realização de espectáculos, sorteios (automóvel, vivenda, etc.) e concursos, o recurso a cotizações e donativos de sócios e simpatizantes, constituíram também formas criativas e generosas de um imprescindível suporte financeiro à construção do Ginásio-Sede.
A manhã de 20 de Maio de 1956 nasceu chuvosa, mas a tarde desse inesquecível domingo virou solarenga e primaveril, associando-se alegremente às distintas e nobres cerimónias de inauguração do Ginásio-Sede. Desde Coina, um imenso cortejo percorreu o Concelho, saudou e foi emocionadamente ovacionado pela sua população. Ilustres personalidades nacionais, com realce para o Ministro da Educação Nacional e o Director Geral dos Desportos, associaram-se a diversas entidades concelhias e distritais, nomeadamente o Governador Civil de Setúbal, o Presidente da Câmara Municipal do Barreiro e o Provedor da Santa Casa da Misericórdia. António Balseiro Fragata procedeu à entrega das chaves do edifício ao Presidente do Futebol Clube Barreirense, Armando da Silva Pais, acompanhado de outros dirigentes, entre os quais Jacinto Nicola Covacich (Presidente da Assembleia Geral) e Francisco Pereira Mendes (Presidente do Conselho Consultivo e de Contas). Sobrelotado de adeptos transbordantes de emoção e alegria, o Ginásio-Sede abriu finalmente as suas portas, ao serviço do Desporto e da Cultura Barreirense, prenúncio de uma história de constantes e inolvidáveis momentos de afirmação desportiva e cívica.
O saudoso jornalista Barreirense Alfredo Zarcos foi indiscutivelmente o mais brilhante e consequente divulgador da heróica construção do Ginásio-Sede. Os seus relatos dos inesquecíveis Comboios da Pedra são testemunhos emocionados, arrebatadores e empolgantes da epopeia mais grandiosa da história do Futebol Clube Barreirense. Na edição de 24 de Maio de 1956, com a sua assinatura, podia ler-se no Jornal do Barreiro: “ Ao cabo de quase sete anos da mais canseirosa, da mais esforçada, da mais heróica cruzada, de tantas que o Barreiro é rico de exemplos, inaugurou-se o maravilhoso Ginásio-Sede do Futebol Clube Barreirense, lar imenso do popular e prestigiado clube da nossa terra (...). Agora tudo é já realidade, facto consumado. Certeza também o era há muito, desde o dia em que os primeiros esforços das gentes Barreirenses abriram, largas e profundas, as fundações de onde começaram surgindo para a luz das grandes realizações, as paredes poderosas desse sonhado lar, tão fortes, tão resistentes, como a vontade rubra que dominava os seus obreiros (...). Está em festa o Barreirense! ”
No próximo sábado, no cinquentenário da sua inauguração, eu quero estar presente no Ginásio-Sede do meu querido Futebol Clube Barreirense. Para honrar a obra e a memória de todos quantos souberam concretizar um sonho lindo, erguer uma obra que tanto orgulha o Barreiro e os Barreirenses. Sei que a alegria e a emoção estarão presentes em todos nós, que as lágrimas escorrerão dos meus e de muitos outros olhos. Nós, Barreirenses, somos assim: emotivos, apaixonados, vibrantes. Assim temos feito História. E assim queremos continuar a Ser.
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Entre os presentes na cerimónia destacou-se, embora já debilitada, a poetisa Maria Helena Bota Guerreiro, que veio a falecer em Fevereiro do ano seguinte. A D. Maria Helena, “emérita trovadora do F. C. Barreirense” (Carlos Silva Pais, Prefácio do livro Giesta em Flor, 2007), brindou-nos com a leitura, sentida e arrebatada, de um magnífico poema alusivo à efeméride.
Foi com ela que aprendi a gostar de poesia, embora não seja, ainda hoje, o meu género literário predilecto. Lembro-me que, quando da publicação em 23 de Outubro de 1967 do livro Brisas e Nortadas, Maria Helena presenteou a minha mãe com um exemplar que li e reli, sempre com muito agrado. Em sua memória, e também de ‘Abril’, permito-me transcrever um poema de sua autoria, que muito recentemente descobri na Biblioteca Municipal do Barreiro, ao folhear o seu segundo livro Poemas do Meu Horizonte, publicado em 1980:
a
1º de Maio de 1974
O dia amanheceu de sol radioso
Nas almas, corações, na natureza.
Tudo foi alegria e tal beleza
Que eu nunca vi um dia tão formoso!
O gesto fraternal e generoso
Surgiu na amplitude da grandeza.
Por toda a parte o riso e a gentileza
Nesse dia de Maio maravilhoso.
Deitámos fora os preconceitos velhos
Sorriso lindo o dos cravos vermelhos!
Que encantadora essa alegria sã!
Bendito o dia do trabalhador!
Lutemos hora a hora com amor
Pla liberdade e paz do Amanhã!
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Epopeia
A construção do Ginásio-Sede foi uma das realizações mais extraordinárias e consequentes do associativismo Barreirense. Em honra de Alfredo Zarcos, ilustre jornalista e meu estimado consócio, que tão valioso contributo deu à História do Barreiro e do FCB, apresento excertos de um dos seus textos mais belos, publicado no Jornal do Barreiro (25 de Janeiro de 1951) quando, passo a passo, mas com uma coragem e dedicação incomensuráveis, os Barreirenses erguiam já a sua futura casa-mãe.
a
II Comboio da Pedra
Seis horas e meia da manhã. Um nevoeiro cerrado envolve o Barreiro que dorme, que repousa na cama a merecida manhã de domingo. A luz mortiça, pobre, da nossa iluminação são pontos baços que o nevoeiro mal deixa distinguir. Reina o silêncio e a humidade da madrugada. Mas lá para as bandas do parque, junto à obra do Barreirense vai grande azáfama. Faz-se ali a concentração para a partida do II “Comboio da Pedra”, organização dos “cem aos duzentos” que vão aparecendo, surgindo de todos os lados como sombras fantásticas saindo da neblina. O infatigável Fragata dirige tudo. Partem as primeiras camionetas e os primeiros carros; vão cheios de gente alegre e voluntariosa. Saem mais carros, motos e até bicicletas! (…)
Chegámos. Eis a pedreira imensa. Lá está o comboio, disperso, recebendo a carga. Vista de cima a enorme clareira afigura-se-nos um formigueiro. Trabalha-se afanosamente. Novos e velhos, gente de variadas posições na vida, nivelados ali pelo mesmo ideal clubista numa manifestação impar de dedicação colectiva de que só a gente da nossa terra é capaz. (…)
Em Coina, uma caravana de trezentos ciclistas aguarda o comboio, escoltando-o; e na manhã, toda luminosidade, triunfante o imenso desfile atinge grandiosa imponência. (…)
A imponente construção está pejada de alto a baixo de gente entusiasta que recebe o comboio em apoteose. (…)
A tarde avançava já, quando a jornada triunfal findou.
Assim se faz colectivismo, no Barreiro e assim o nosso povo se enobrece.
a
A Bola, na sua edição de 21 de Maio de 1956, em reportagem assinada por Afonso Lacerda, com o título “Do Sonho à Realidade…”, dedicou toda a sua última página ao acontecimento. Quatro fotos ilustraram a peça, uma das quais a de António Balseiro Fragata, intrépido activista da sua construção, Presidente da “Grande Comissão Pró-Ginásio”, a quem Afonso Lacerda dedicou as seguintes palavras:
Alma grande em corpo franzino, autêntico repositório de energias e exemplo vivo do muito que os homens podem fazer quando lutam por um ideal e sabem vencer com fé e entusiasmo os obstáculos que para outros constituem barreiras intransponíveis (…)
Lutou, mas sentiu sempre à sua volta outras vontades, igualmente fortes e decididas, de homens que queriam levar avante essa iniciativa.
Conjugou esforços e dedicações. Orientou vontades e entusiasmos, de modo a tirar o mais alto rendimento das possibilidades que se lhe ofereciam.
Durante sete anos, sem tréguas, sem férias, sem descanso, António Balseiro lutou e venceu. Venceu as dificuldades e os cépticos, dotando o seu clube, a sua terra e o seu país duma obra que é motivo de orgulho de todos os que nela colaboraram e daqueles que a podem agora admirar, como desportistas e como portuguesesa
A construção do Ginásio-Sede foi uma das realizações mais extraordinárias e consequentes do associativismo Barreirense. Em honra de Alfredo Zarcos, ilustre jornalista e meu estimado consócio, que tão valioso contributo deu à História do Barreiro e do FCB, apresento excertos de um dos seus textos mais belos, publicado no Jornal do Barreiro (25 de Janeiro de 1951) quando, passo a passo, mas com uma coragem e dedicação incomensuráveis, os Barreirenses erguiam já a sua futura casa-mãe.
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II Comboio da Pedra
Seis horas e meia da manhã. Um nevoeiro cerrado envolve o Barreiro que dorme, que repousa na cama a merecida manhã de domingo. A luz mortiça, pobre, da nossa iluminação são pontos baços que o nevoeiro mal deixa distinguir. Reina o silêncio e a humidade da madrugada. Mas lá para as bandas do parque, junto à obra do Barreirense vai grande azáfama. Faz-se ali a concentração para a partida do II “Comboio da Pedra”, organização dos “cem aos duzentos” que vão aparecendo, surgindo de todos os lados como sombras fantásticas saindo da neblina. O infatigável Fragata dirige tudo. Partem as primeiras camionetas e os primeiros carros; vão cheios de gente alegre e voluntariosa. Saem mais carros, motos e até bicicletas! (…)
Chegámos. Eis a pedreira imensa. Lá está o comboio, disperso, recebendo a carga. Vista de cima a enorme clareira afigura-se-nos um formigueiro. Trabalha-se afanosamente. Novos e velhos, gente de variadas posições na vida, nivelados ali pelo mesmo ideal clubista numa manifestação impar de dedicação colectiva de que só a gente da nossa terra é capaz. (…)
Em Coina, uma caravana de trezentos ciclistas aguarda o comboio, escoltando-o; e na manhã, toda luminosidade, triunfante o imenso desfile atinge grandiosa imponência. (…)
A imponente construção está pejada de alto a baixo de gente entusiasta que recebe o comboio em apoteose. (…)
A tarde avançava já, quando a jornada triunfal findou.
Assim se faz colectivismo, no Barreiro e assim o nosso povo se enobrece.
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A Bola, na sua edição de 21 de Maio de 1956, em reportagem assinada por Afonso Lacerda, com o título “Do Sonho à Realidade…”, dedicou toda a sua última página ao acontecimento. Quatro fotos ilustraram a peça, uma das quais a de António Balseiro Fragata, intrépido activista da sua construção, Presidente da “Grande Comissão Pró-Ginásio”, a quem Afonso Lacerda dedicou as seguintes palavras:
Alma grande em corpo franzino, autêntico repositório de energias e exemplo vivo do muito que os homens podem fazer quando lutam por um ideal e sabem vencer com fé e entusiasmo os obstáculos que para outros constituem barreiras intransponíveis (…)
Lutou, mas sentiu sempre à sua volta outras vontades, igualmente fortes e decididas, de homens que queriam levar avante essa iniciativa.
Conjugou esforços e dedicações. Orientou vontades e entusiasmos, de modo a tirar o mais alto rendimento das possibilidades que se lhe ofereciam.
Durante sete anos, sem tréguas, sem férias, sem descanso, António Balseiro lutou e venceu. Venceu as dificuldades e os cépticos, dotando o seu clube, a sua terra e o seu país duma obra que é motivo de orgulho de todos os que nela colaboraram e daqueles que a podem agora admirar, como desportistas e como portuguesesa
a
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O infatigável Fragata
a
Tive o prazer de conhecer e conviver com António Balseiro Fragata. Funcionário da Câmara Municipal de Lisboa, nasceu em Leiria, mas residiu no Barreiro desde muito novo. Amigo de meu pai, guardo dele a imagem de um homem muito sério, educado, apaixonado pelo seu clube e respeitadíssimo por toda a Família Barreirense. Feliz o clube que teve no seu seio tão ilustre personagem e protagonista.
Mas se a história da construção do Ginásio-Sede passa inevitavelmente pela referência a António Balseiro Fragata, é obrigatória a exortação de todos os Barreirenses que contribuíram para a sua edificação, com trabalho generoso, gratuito, empenhado e competente. E, também de populares anónimos, alguns dos quais não residentes no Barreiro, como se conclui deste exemplo espantoso, expresso na seguinte carta, assinada por José Jesus Duarte (Lisboa), em representação de sete desconhecidos entusiastas do clube ‘alvi-rubro’, publicada na secção de Alfredo Zarcos “Coisas da Nossa Terra” (Jornal do Barreiro, 27 de Dezembro de 1951).
Eu e mais sete colegas, todos vidraceiros, propusemo-nos auxiliar-vos na colocação de todos os vidros do vosso Ginásio-Sede, se acaso esse trabalho não está começado ou concluído.
Seríamos sete homens, a quem os senhores nada teriam que pagar e nós sentiríamos grande prazer em podermos deste modo ser úteis `a vossa obra e em prol do Desporto.
a
A primeira sede do FCB situara-se na Rua do Conselheiro Serra e Moura (actual Rua Almirante Reis), nº139. Em Maio de 1912 transferiu-se para a Rua Aguiar, nº 49, em 1918 para o nº 111 e posteriormente para o nº 150 (no Largo do Casal). Entre 1932 e 1937 a sua sede localizou-se em Lisboa, regressando ao Barreiro em 1939, ocupando o Chalet Rebelo (2 pisos), sito na Rua Dr. António José de Almeida. De Abril de 1940 a Maio de 1956, o FCB teve a sua sede social localizada no nº 154 da Rua Marquês do Pombal.
a
A construção do Ginásio-Sede revestiu-se de enorme importância. A dinâmica criada a partir de 1941, com a formalização do “Movimento Pró-Sede” e, sobretudo a partir de 1946, pela criação da “Grande Comissão Pró-Ginásio”, teve consequências imediatas:
- o número de associados cresceu vertiginosamente; quadruplicou de cerca de 500 em 1947 para aproximadamente 2000 em 1950
- perspectivou-se e consolidou-se um alargamento da influência do clube no tecido económico, social e cultural do Concelho
- verificou-se um revigoramento das actividades desportivas
- reforçou-se a mística e a identidade Barreirenses.
Ao longo de mais de cinquenta anos, o Ginásio-Sede tem sido local de convívio e de tertúlia. Frequentado por muitos sócios do clube. De há vários anos a esta parte é raro encontrar, à excepção dos vogais do basquetebol, dirigentes dos Órgãos Sociais no Ginásio-Sede, para além das noites de Reunião de Direcção, Assembleia-Geral ou Cerimónias Solenes. E, mesmo nesses momentos, é vê-los entrar e sair apressados e fugidios. Não é aquela a nossa Sede? Não era dali que uma multidão de sócios debandava nas tardes de domingo rumo ao ‘Manuel de Mello’? Não foi ali, que em noites de magia, comemorámos as grandes vitórias de todas as modalidades? A quem convém ocultar e fazer esquecer esta verdade e esta tradição? A quem?
a
Tive o prazer de conhecer e conviver com António Balseiro Fragata. Funcionário da Câmara Municipal de Lisboa, nasceu em Leiria, mas residiu no Barreiro desde muito novo. Amigo de meu pai, guardo dele a imagem de um homem muito sério, educado, apaixonado pelo seu clube e respeitadíssimo por toda a Família Barreirense. Feliz o clube que teve no seu seio tão ilustre personagem e protagonista.
Mas se a história da construção do Ginásio-Sede passa inevitavelmente pela referência a António Balseiro Fragata, é obrigatória a exortação de todos os Barreirenses que contribuíram para a sua edificação, com trabalho generoso, gratuito, empenhado e competente. E, também de populares anónimos, alguns dos quais não residentes no Barreiro, como se conclui deste exemplo espantoso, expresso na seguinte carta, assinada por José Jesus Duarte (Lisboa), em representação de sete desconhecidos entusiastas do clube ‘alvi-rubro’, publicada na secção de Alfredo Zarcos “Coisas da Nossa Terra” (Jornal do Barreiro, 27 de Dezembro de 1951).
Eu e mais sete colegas, todos vidraceiros, propusemo-nos auxiliar-vos na colocação de todos os vidros do vosso Ginásio-Sede, se acaso esse trabalho não está começado ou concluído.
Seríamos sete homens, a quem os senhores nada teriam que pagar e nós sentiríamos grande prazer em podermos deste modo ser úteis `a vossa obra e em prol do Desporto.
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A primeira sede do FCB situara-se na Rua do Conselheiro Serra e Moura (actual Rua Almirante Reis), nº139. Em Maio de 1912 transferiu-se para a Rua Aguiar, nº 49, em 1918 para o nº 111 e posteriormente para o nº 150 (no Largo do Casal). Entre 1932 e 1937 a sua sede localizou-se em Lisboa, regressando ao Barreiro em 1939, ocupando o Chalet Rebelo (2 pisos), sito na Rua Dr. António José de Almeida. De Abril de 1940 a Maio de 1956, o FCB teve a sua sede social localizada no nº 154 da Rua Marquês do Pombal.
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A construção do Ginásio-Sede revestiu-se de enorme importância. A dinâmica criada a partir de 1941, com a formalização do “Movimento Pró-Sede” e, sobretudo a partir de 1946, pela criação da “Grande Comissão Pró-Ginásio”, teve consequências imediatas:
- o número de associados cresceu vertiginosamente; quadruplicou de cerca de 500 em 1947 para aproximadamente 2000 em 1950
- perspectivou-se e consolidou-se um alargamento da influência do clube no tecido económico, social e cultural do Concelho
- verificou-se um revigoramento das actividades desportivas
- reforçou-se a mística e a identidade Barreirenses.
Ao longo de mais de cinquenta anos, o Ginásio-Sede tem sido local de convívio e de tertúlia. Frequentado por muitos sócios do clube. De há vários anos a esta parte é raro encontrar, à excepção dos vogais do basquetebol, dirigentes dos Órgãos Sociais no Ginásio-Sede, para além das noites de Reunião de Direcção, Assembleia-Geral ou Cerimónias Solenes. E, mesmo nesses momentos, é vê-los entrar e sair apressados e fugidios. Não é aquela a nossa Sede? Não era dali que uma multidão de sócios debandava nas tardes de domingo rumo ao ‘Manuel de Mello’? Não foi ali, que em noites de magia, comemorámos as grandes vitórias de todas as modalidades? A quem convém ocultar e fazer esquecer esta verdade e esta tradição? A quem?
a
[Excerto do Capítulo IV - Locais de Culto
Livro PROVA DeVIDA - Estórias e memórias do meu Barreirense]
(continua)
Livro PROVA DeVIDA - Estórias e memórias do meu Barreirense]
(continua)