Acabo de reler um texto que publiquei em janeiro de 2008 em www.rostos.pt.
Hoje, primeiro dia de 2022, e prestes a completar 13 anos da sua redação,
parece-me que não está particularmente datado e que, a quatro semanas de novo
ato eleitoral em Portugal, me apetece aqui e agora reproduzi-lo.
Teve por título “Os caramelos de Ayamonte”. Percebam porquê... mais
adiante.
“A notícia corria por aí, tímida e insinuante, mas parece ser agora pública
e verdadeira: António de Oliveira Salazar foi o mais votado na 2ª fase de “Os
Grandes Portugueses”.
A escolha dos telespectadores vale o que vale, não tem substrato científico,
dispensa conclusões apressadas, mas não deixa de merecer alguma reflexão e
perplexidade.
Quem são os
portugueses que deram esta posição de liderança ao principal protagonista de um
regime anti-democrático, ditatorial e totalitário que nos oprimiu quase cinco
décadas?
- os milhões de portugueses que no 1º de Maio de 1974 ― já os contornos da
“Revolução dos Cravos” estavam mais claramente definidos ― saíram às ruas e
praças para festejar a Libertação?
- os que sofreram, direta ou colateralmente, os efeitos da repressão
fascista ― prisão, exílio, deportação, tortura, … ?
- os que estiveram ― ou quase lá foram parar ― em África, numa Guerra
Colonial, tão estúpida e destemperada nos seus objetivos, quão ruinosa e
devastadora para o nosso desenvolvimento?
- os que cresceram em escolas unissexo e pretensamente disciplinadas?
- os que não puderam ver os seus filhos aceder a uma Universidade
tendencialmente classista e elitista?
- os que se obrigaram a falar em surdina e a sintonizar “ondas curtas”?
- os que não puderam ler Gorki, ouvir Gainsbourg, ver Buñuel?
- os que regressaram de Ayamonte, com os caramelos e as garrafas “contadas”?
Claro que não!
Para avivar a memória (ou aprender a História), nada como ler Fernando Dacosta
em “Máscaras de Salazar (Edição Casa das Letras) ― retrato culto e inteligente
de um Portugal amordaçado, triste, pequenino, mesquinho, pobre, deprimido,
isolado.
Mas…
Álvaro Cunhal terá sido a segunda personalidade mais votada!
Mais do mesmo…
Ocorre-me sugerir a leitura de “Stasiland – do outro lado do muro de Berlim”
(Prémio Samuel Johnson 2004 – Editora Civilização) de Anna Funder e de “Gulag –
uma história” de Anne Applebaum (Prémio Pulitzer 2004 – Editora Civilização).
Dois excelentes livros, como tal reconhecidos e justamente premiados, recentes
e convincentes, que nos demonstram e elucidam, mais uma vez, a perfídia,
monstruosidade e perversidade dos extintos regimes “socialistas” de leste.
Afinal… dois novos e peculiares testemunhos que desenvolvem e amplificam o
nosso conhecimento acerca de métodos e factos que outros anteriormente
divulgaram a propósito da deriva totalitária da “Revolução de Outubro”.
Os portugueses votaram desde Abril de 1975, maciça e repetidamente, nos
partidos políticos que representam o pensamento democrático ― social-democrata
ou liberal ― da Civilização Ocidental.
Por isso recusaram as ditaduras ― a fascista e as outras…
Assim mergulhámos na Europa, bebemos da Europa, aprendemos com a Europa.
E nos reconciliámos com os valores de Liberdade, Fraternidade e Igualdade.”
FELIZ ANO NOVO!!!