
Há coisas engraçadas.
Passadas pucas horas do início da leitura do livro de António José Vilela (Casa das Letras, 2005), ouvi, no final da tarde de quarta-feira, uma entrevista de Otelo Saraiva de Carvalho ao RCP.
Em Junho de 1976, nas eleições presidenciais ganhas por António Ramalho Eanes, 792 760 portugueses deram o seu voto a Otelo. Fui um deles.
"O Povo segue em frente. Otelo a Presidente" - ouviu-se nas ruas de Portugal, por essas semanas que antecederam o escrutínio popular.
No seu périplo nacional, Otelo fez uma breve paragem no Barreiro, com uma curtíssima e "politicamente correcta" intervenção no Campo do Luso. Para, disseram alguns, não hostilizar a força dominante local - o PCP.
Já sem ilusões revolucionárias, progressiva e irreversivelmente distante das cartilhas marxistas (leninistas, maoistas, trotskistas ou de qualquer outro matiz), ainda aderi a um voto de protesto.
Julguei então ter reafirmado, na inocência dos meus 19 anos, um ideal de esquerda, de progresso e de liberdade. Como estava ainda enganado...
No rescaldo desse momento histórico, em que não aderira a qualquer partido político, pensei que jamais viria a fazê-lo. O que aconteceu até agora, e assim continuará.
Voto sempre. Tenho convicções. Não sou equidistante nas escolhas que - nacional e localmente - convictamente assumo em cada acto eleitoral.
Mas ter “fígado” para integrar um colectivo partidário e para aceitar as realidades que julgo conhecer na sua essência…
Também Otelo diz ter-se afastado definitivamente da vida partidária. Porque o povo não o compreende(u).
Ainda bem que o fez. E, sobretudo, ainda bem que a sua ideologia (?) não fez vencimento.
Que teria sido de Portugal e dos Portugueses se acaso qualquer utopia marxista tivesse saído vencedora nos duros combates de 1975?
Que teria sido de Portugal e dos Portugueses se a ameaça permanente de qualquer associação político-partidária de vocação militar e totalitária como o Projecto Global / OUT / FP-25 tivessem continuado a espalhar ameaça, terror, sofrimento e morte?
Otelo não se distancia hoje dos erros de ontem.
Está desiludido. Mas não arrependido.
Otelo tem um discurso errático. Contraditório.
Foi uma entrevista lamentável. Deplorável.
Entretanto, a Democracia segue em frente…
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