terça-feira, janeiro 20, 2009

Memória Barreirense (XLV)


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Modernizar e Democratizar
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É urgente e inadiável modernizar e democratizar o FCB!
Os Estatutos representam o ordenamento jurídico que condiciona e legitima toda a sua actividade. Devem adequar-se ao edifício jurídico geral do país e assumir-se como agente catalizador de uma mudança que tenho vindo a propor. Em 2006 desenvolvi a opinião de que é necessária e premente uma revisão estatutária para o FCB (“Por uma revisão dos Estatutos do FCB”, Jornal do Barreiro de 15 de Setembro). Limitar-me-ei agora a relembrar, a este respeito, as três principais ideias que então formulei, e que mantenho como válidas.
Ao ecletismo do FCB, traduzido na prática actual de seis modalidades, deverá corresponder uma adequada representação orgânica nos seus Órgãos Sociais. O Futebol e o Basquetebol são, inegavelmente, as modalidades mais representativas, mas o Xadrez, a Ginástica, o Kickboxing e a Natação são muito importantes no projecto desportivo do clube e têm prosseguido um percurso de afirmação, difícil mas permanente. Todas elas devem estar devidamente representadas e incorporadas a nível directivo, o que presentemente não se verifica. Parece-me assim correcta e consequente, a proposta de ampliação do número actual de Vice-Presidências da Direcção.
Em segundo lugar, defendo a criação, a exemplo do que já hoje acontece noutros clubes portugueses, de um órgão de reflexão e aconselhamento – o Conselho Barreirense – em substituição do estatutariamente consignado mas na prática inexistente Conselho Geral. Seria um órgão a eleger em Assembleia-Geral e porventura sem poder deliberativo, vocacionado e orientado para apoiar a Direcção na definição das grandes opções estratégicas do clube, e que deveria constituir-se como um grupo alargado de associados, globalmente representativo da sua pluralidade geracional, educacional, motivacional.
Por último, como então escrevi, “importa gratificar de forma mais vincada, e sem complexos, aqueles que fiéis à sua opção e sentimento, permanecem nossos consócios década após década”. A fórmula um sócio - um voto parece-me arcaica, injusta e desajustada. Importa corrigir, com coragem e com equilíbrio, esta fragilidade e incoerência do nosso regulamento eleitoral. Proponho então que o número de votos de cada sócio seja definido em função da sua longevidade associativa.
Estas três propostas de alteração estatutária que aqui recoloco, pretendem constituir um pontapé de saída (uma bola ao ar, um lance de peão e4, …), um contributo e um desafio que lanço para análise e discussão, a propósito de uma problemática que, repito, considero da máxima importância para o nosso futuro.
Para além da revisão estatutária sugerida, e que deverá suscitar o interesse, a participação e o contributo de um número significativo de associados, considero que os caminhos da modernização do FCB apenas serão trilhados com outra capacidade, eficácia e consistência, se o clube ousar promover e concretizar uma verdadeira e indispensável reforma administrativa. O aparente antagonismo entre uma estrutura administrativa profissional (Secretaria Central, Secções de Futebol e de Basquetebol, Departamento de Marketing, …) e um corpo de Directores e Seccionistas amador, não deve deixar margem para qualquer dúvida: quem define a gestão desportiva, financeira e administrativa do clube e determina as normas orientadoras para a sua implementação é a Direcção, emanada do sufrágio directo e universal dos associados, em Assembleia-Geral eleitoral.
O quadro administrativo do nosso clube tem de ser reformulado, melhorado, renovado. Em quantidade e em qualidade. É necessária mais competência, mais criatividade, mais polivalência. O recurso às novas tecnologias de informação, ainda num grau inacreditavelmente incipiente, tem de ser incrementado. É inaceitável que aspectos e factos tão simples, mas paralelamente tão importantes da vida do clube, como a divulgação da agenda desportiva semanal e a convocatória de Assembleias-Gerais, não sejam efectuados por newsletter a um número significativo dos nossos associados que em percentagem já certamente interessante têm acesso à Internet e prática regular da sua utilização.
Em sociedades modernas e abertas – que pretendemos incessantemente melhorar e aperfeiçoar – a circulação da informação, a transparência das políticas, o debate das ideias, são factores determinantes de Liberdade, de Democracia e de Progresso. A aproximação e o diálogo entre dirigentes e dirigidos, entre eleitos e eleitores, são condições indispensáveis para que no Barreirense todos sejamos protagonistas da construção e da transformação diária e permanente do clube que escolhemos e abraçámos. Quanto maior for esta consciência e esta comunhão, maior será a possibilidade dos Barreirenses, de todos os Barreirenses, entenderem as dificuldades presentes e os grandes desafios que se perspectivam.
O FCB necessita de uma redefinição estratégica e programática, de uma reformulação da política desportiva e de uma contenção orçamental, dolorosa mas inevitável. Quase me apetece falar em refundação do Barreirense. Exagero?
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Um clube com Projecto

O FCB deve ser um clube com projecto desportivo. Um projecto claro, sensato e coerente. Um projecto pensado, discutido e assumido. O FCB deve permanecer um Clube Eclético, Formador, Sério e Realista.
Clube Eclético: o Futebol e o Basquetebol têm sido as modalidades mais importantes e representativas. O número de praticantes, os títulos regionais e nacionais alcançados, a internacionalização de um número significativo de atletas, em representação das nossas cores, ou após transferência para outros clubes, são o testemunho desta evidência.
Apesar de afastado do principal escalão desde a década de 70, o Futebol ocupa ainda hoje o 23º lugar no ranking nacional. A conquista da Taça Ribeiro dos Reis (1968) e a participação na Taça das Cidades com Feira (1970) foram alguns dos momentos altos que tive a emoção de presenciar. As tardes de domingo no ‘Manuel de Mello’, com alegres e coloridas romarias populares aquando das visitas do Benfica, Sporting, FC Porto, Belenenses e Vitória de Setúbal, estarão ainda presentes na memória de muitos de nós.
No Basquetebol, a conquista de 2 Campeonatos Nacionais da I Divisão e de 6 Taças de Portugal foram proezas inesquecíveis. A visita do Real Madrid ao Barreiro (1958) foi um momento relevante da vida desportiva da então vila operária. Somos presentemente o primeiro clube nacional nos escalões de formação; 27 títulos nacionais, 16 dos quais obtidos nos últimos dez anos, são demonstração inequívoca desse estatuto.
O Xadrez conseguiu afirmar-se no panorama nacional nas duas últimas décadas, com bons resultados individuais e colectivos. O Kickboxing, porventura mais discreto e com menor visibilidade, tem também obtido algumas boas prestações. A Ginástica, modalidade de tão grande tradição no clube, embora sem o fulgor de outros tempos, prossegue o seu caminho. A Natação, limitada pelo espaço exíguo e recorrentemente problemático da Piscina Municipal, vem cumprindo uma função pedagógica e de lazer.
Importa que estas seis modalidades continuem a sua actividade, preservando a matriz eclética do FCB. Creio que seria interessante equacionar a prática de uma outra modalidade colectiva no nosso clube. O Voleibol, que teve alguma evidência na cidade há cerca de três décadas, ou o Andebol, modalidade sem expressão no histórico do desporto local, poderiam assumir-se como novas experiências, de forma paulatina, em articulação com o desporto escolar, e restrita numa primeira fase à prática nos escalões mais jovens.
Clube Formador: o FCB tem-se assumido no panorama desportivo nacional como um paradigma da formação de atletas, condição que nos identifica e nos distingue de muitos outros clubes, e que sustenta a prossecução da nossa actividade a nível sénior.
Apesar das manifestas insuficiências das estruturas e equipamentos desportivos disponíveis, as Secções de Futebol e de Basquetebol têm conseguido implementar a prática destas modalidades, de forma qualificada, a número muito significativo de jovens. Relembro que até Setembro último, o clube apenas dispunha de um relvado, entretanto desactivado, e que a prática de futebol nos escalões de formação, com a excepção da equipa júnior se desenrolava no pelado da Verderena, com iluminação e balneários obsoletos. Ainda assim, o Barreirense tem sido presença quase constante nos Campeonatos Nacionais de iniciados, juvenis e juniores, num esforço assinalável de atletas, pais, treinadores e dirigentes, que importa registar e enaltecer.
Ainda que melhor, a situação do Basquetebol está muito longe de corresponder às necessidades. O Ginásio-Sede tem uma área claramente exígua para o número de atletas que diariamente aí treina. Já acusava a voragem e erosão dos anos, com um piso degradado e perigoso para a integridade física dos atletas, situação finalmente ultrapassada em Outubro de 2007, com a implantação de um novo e magnífico piso. Algumas escolas secundárias têm protocolado com o clube a disponibilização dos seus pavilhões, uma alternativa útil, mas claramente de recurso. E a participação desde o ano 2000 na competição profissional só foi possível pela adaptação in extremis do Pavilhão Municipal Luís de Carvalho às exigências mínimas da Liga de Clubes de Basquetebol.
É neste contexto físico, qualitativa e quantitativamente muito deficitário, que o futebol e o basquetebol têm prosseguido a sua missão desportiva e educativa, com resultados desportivos muito para além dessa triste realidade. Autêntico milagre, dirão os mais atentos… com toda a razão!
Apesar destas dificuldades estruturais, das limitações orçamentais, dos problemas demográficos do Concelho, da crescente e nefasta atracção, no caso do futebol, dos centros de formação do Sporting (Alcochete) e do Benfica (Seixal), há que continuar e aprofundar uma política desportiva assente na formação de atletas e no aproveitamento dos mais talentosos para as equipas sénior. As nossas equipas de formação deverão continuar a ser alimentadas pela juventude do Barreiro e Concelhos limítrofes, com o recurso excepcional e equilibrado a atletas de outras proveniências, desde que acrescentem qualidade e competitividade. É que também somos um clube ambicioso e ganhador, e assim queremos continuar a ser.
A constituição das equipas de alta competição, com contextos e exigências manifestamente diferentes, deverá assentar nos atletas mais destacados oriundos da formação do clube. O recrutamento de outros atletas, mais experientes e quase sempre mais onerosos, continuará a ser uma necessidade óbvia e inquestionável, mas que deverá ser gerida com ponderação e inteligência. A promoção dos treinadores Barreirenses, a definição e implementação de modelos de jogo, a formação de dirigentes, seccionistas e colaboradores das secções (nas áreas da comunicação, estatística, etc.) deverão ser também aspectos programáticos de uma política desportiva que decorre em muitos aspectos da actual, mas que importa analisar e actualizar.
Clube Sério: notícias recentes [a propósito do caso Apito Dourado], mesmo se oriundas de gente aparentemente pouco credível e sem escrúpulos, mas com um grau de conhecimento de factos e situações que poderá vir a revelar-se de transcendente importância, mais não fizeram do que acrescentar um novo capítulo a uma novela triste e sórdida do futebol português. Múltiplos protagonistas do chamado desporto-rei – dirigentes, árbitros, empresários, políticos – têm enlameado os terrenos que pisam, desvirtuado a verdade desportiva e contribuído para a desacreditação do desporto em geral e do futebol em particular, inexplicavelmente (?) escudados e protegidos em alguns sectores dos meios jornalístico, político e judicial, numa teia de interesses e cumplicidades que importa investigar e condenar. Nesta torrente de suspeição, crescentemente avassaladora, pretende-se por vezes incorporar no mesmo saco, de forma apressada, leviana e injusta, a generalidade dos dirigentes e dos outros agentes desportivos. O FCB tem sido ao longo dos tempos um clube de enorme seriedade, onde os ilícitos internos terão sido excepcionais e a colaboração ou cumplicidade com esquemas menos transparentes, algo de completamente estranho à sua História. Assim tem sido, e assim será! Somos um exemplo de cultura cívica e desportiva. Esta(re)mos na vanguarda da luta pela verdade desportiva.
Clube Realista: o FCB deverá ser um clube responsável!
Orçamentos rigorosos e sustentáveis, com ponderação justa da atribuição às modalidades das receitas gerais do clube, um esforço de auto-financiamento das Secções, o controle rigoroso das receitas e despesas pelo Conselho Consultivo e de Contas, deverão constituir algumas das linhas orientadoras dos Órgãos Sociais. Imune a momentos financeiros conjuntural e excepcionalmente mais favoráveis, imune a caprichos pessoais ou de grupo, imune a derivas desportivas irresponsáveis e fugazes, os seus dirigentes deverão prosseguir uma política de coerência, estabilidade e contenção. Coerência, estabilidade e contenção, ao serviço de um Clube com Projecto, serão as vias mais consequentes de renovação e fortalecimento do FCB.

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[Excerto do Capítulo VIII - Amanhã
Livro PROVA DeVIDA - Estórias e memórias do meu Barreirense]
(continua)