domingo, novembro 02, 2008

Memória Barreirense (XVI)


cc
E… não desistir

Por solicitação de António Sousa Pereira, Director de Rostos, publiquei em 11 de Abril de 2007 um texto alusivo às comemorações do 96º aniversário do FCB:

Nuvem passageira

A cada dia, sua pena e sua esperança
(Provérbio português)

Celebra-se esta noite o 96º aniversário do Futebol Clube Barreirense (FCB), em sessão solene que terá lugar no Ginásio-Sede do prestigiado, histórico e popular clube do Barreiro.
É verdade que ainda me emociono com o momento da entrega dos emblemas aos associados com 25 e 50 anos de filiação. É verdade que continuo a aplaudir com redobrada energia os nossos mais recentes campeões nacionais. É verdade que me agrada reencontrar consócios e amigos, que as circunstâncias da vida apenas permitem rever a espaços.
Mas confesso que ano após ano vou ficando algo cansado e um pouco saturado pelo formato e conteúdo, monótono e repetitivo, do nosso ‘11 de Abril’. Apetece-me ser bucólico e nostálgico, rever e agradecer o esforço colectivo de gerações sucessivas de Barreirenses, que deram nobreza, vitalidade e consistência a este grande clube. E, simultaneamente, situar-me na contra-corrente, e afirmar, sem medos e sem ponta de constrangimento, que estou insatisfeito com o presente e preocupado, muito preocupado, com o futuro.
Assistirei esta noite, como é habitual e politicamente correcto neste tipo de cerimónias, a um desfilar de discursos e intervenções de personalidades institucionais e de convidados mais ou menos ilustres e significantes no contexto político e desportivo, glosando o passado riquíssimo do FCB e desejando que o seu futuro seja próspero e fecundo. Não é esse o meu actual estado de alma, nem o propósito destas minhas palavras.
Em 21 de Julho de 2004 assumi funções de responsabilidade no FCB, como Vogal da Direcção, em representação da Secção de Basquetebol, que vivia então (ainda se lembram?) uma realidade particularmente difícil, por uma ameaça tão real quão iníqua de extinção da modalidade no clube, pelo menos na sua componente (semi)profissional. A experiência acumulada em dois anos de mandato, nos quais além de servir o projecto do Barreirense Basket, procurei ter uma actividade de maior abrangência no interior dos seus órgãos sociais, permitiu-me obter um conhecimento mais real do FCB, nas suas vertentes desportiva, administrativa e financeira. E prometer, no momento da saída, continuar a reflectir e a intervir.
Nesse propósito reflexivo e de criticismo construtivo, escrevi recentemente um conjunto de dez textos subordinados ao tema “Barreirense: que futuro?”, publicados no Jornal do Barreiro, entre 1 de Dezembro de 2006 e 2 de Fevereiro de 2007. E que coligi num texto global, disponível para envio pelo meu endereço electrónico, a todos quantos manifestarem interesse na sua leitura. As palavras iniciais do primeiro capítulo deram o mote para a minha preocupação principal: “Será o Barreirense um clube com futuro?”. E continuava: “Num tempo em que Portugal se defronta com graves dificuldades financeiras e a recuperação económica tarda em consolidar-se, a generalidade dos clubes desportivos acusa evidentes sinais de fragilidade e dependência. Alguns pereceram, outros têm a morte anunciada, muitos revelam uma viabilidade manifestamente comprometida”. Para alertar de seguida: “É neste contexto de dificuldades e constrangimentos económico-financeiros e de um novo enquadramento legal, que importa reflectir acerca do futuro do Barreirense”. E propor: “O Barreirense do século XXI deverá ser:
- conceptualmente criativo
- desportivamente ambicioso
- estruturalmente realista
- administrativamente moderno
- política e financeiramente independente.
Alguns conceitos programáticos deverão servir de fundamento para uma acção consequente. Assim, importa em minha opinião:
- analisar e reforçar a matriz e identidade do clube
- promover uma revisão e actualização estatutária
- definir uma nova política desportiva
- modernizar a organização administrativa
- projectar a estrutura e dimensão das instalações desportivas
- fomentar o crescimento da massa adepta e associativa
- renovar as áreas de comunicação, imagem e merchandising
- melhorar os índices de democraticidade e participação
- incrementar a inserção na juventude Barreirense
- reformular e actualizar os contrato-programa com a autarquia
- atrair e conquistar o tecido empresarial local e regional
- aprofundar a ligação aos agentes culturais do Concelho”.
A escassas semanas de completar 50 anos de filiação no FCB estou, como atrás referi, insatisfeito com o presente e preocupado, muito preocupado, com o futuro do meu clube de sempre. Insatisfeito pelo défice de participação dos associados na vida quotidiana do clube que escolheram como seu. Insatisfeito pela forma, por vezes autista e sobranceira, como os líderes do FCB prosseguem a sua actividade directiva. Preocupado com a actual situação patrimonial, decorrente da venda do ‘Manuel de Mello’. Preocupado com a ausência de projecto desportivo, comunicacional e cultural em que (sobre)vive o FCB.
Prestes a mergulhar no 4º escalão do futebol nacional, o FCB corre um risco, sério e real, de ver a sua generosa mas adormecida massa associativa cair numa descrença amarga e perigosa, quiçá suicida. Quando em 1966 o FCB desceu de novo à II Divisão, o grande Presidente Luís Raimundo dos Santos, que tive o privilégio de conhecer e ter por amigo, protagonizou, em colaboração com muitos e bons Barreirenses, a Festa da Unidade Barreirense. O 22 de Outubro desse ano foi, muito para além das expectativas mais optimistas, um momento inesquecível de crença e esperança na vida, agora quase centenária, do FCB. E o FCB foi nessa época, pela quinta vez, campeão nacional, regressando ao escalão maior do nosso futebol.
Será que a Direcção actual, presidida por Manuel Lopes, tem a vontade e o élan, a têmpera e a crença, o saber e o engenho necessários para ultrapassar o momento de grave crise que hoje vivemos?
Gostaria de ver a minha pergunta claramente respondida e assumida pelos dirigentes que ajudei a eleger. Como gostaria de ver os meus consócios acordar da letargia presente e contribuir com outro empenho e capacidade na revitalização (refundação?) do FCB.
Escrevi há algumas semanas: “Será apenas através de um contributo mais activo e alargado dos seus associados, do talento, criatividade, empenhamento e bom senso dos seus dirigentes, e da capacidade de diálogo e colaboração solidária, harmoniosa, transparente e moderna, com a Câmara Municipal do Barreiro e com os agentes económicos da cidade, que o Barreirense poderá ultrapassar as graves dificuldades e constrangimentos actuais. E prosseguir um percurso desportivo de mérito (na formação e na alta competição), um desempenho de relevo na sociedade Barreirense, um estatuto de Utilidade Pública tão legitimamente adquirido. Caso contrário, não estarão criadas, em minha opinião, as condições mínimas para a prossecução de objectivos desportivos competitivos semelhantes aos actuais, e o Barreirense será obrigado a recuar para patamares bem menos ambiciosos, de alcance e consequências ainda muito pouco discutidas e consciencializadas pela imensa maioria dos Barreirenses”.
Ao longo de 96 anos, o Barreirense tem sabido manter um vínculo genuíno, claro e estratégico com o Povo do Barreiro, crescendo gemelarmente com ele, abraçando-o nos momentos de vitória e com ele sofrendo as vicissitudes e as desilusões das derrotas e dos insucessos. Damos voz, alegria e identidade ao Barreiro e aos Barreirenses. Somos parte da sua História. O Barreiro orgulha-se de nós!
Hoje, dia de aniversário, lá estarei…
Conto com a sua presença, amiga e solidária.
Sei que algumas lágrimas espreitarão os meus olhos castanhos. Sou assim!
Afinal… como tantos outros Barreirenses.
Força Barreirense!!!
Parabéns Barreirense!!!
ccc

ccc

Pelo Barreirense… sempre!

Durante o mandato directivo fui adquirindo uma ideia muito precisa de quanto é (será) importante a colaboração dos diversos órgãos de comunicação social local e regional. Todos, sem excepção, mostraram-se sempre disponíveis para divulgar as actividades do FCB.
Após ter cessado funções directivas, entendi oportuno divulgar alguns textos de opinião, nem sempre totalmente coincidentes ou concordantes com a Direcção do clube. Em Rostos e no Jornal do Barreiro, as portas estiveram sempre abertas. Pelo facto, agradeço aos seus Directores, António Sousa Pereira e Miguel de Sousa, respectivamente.
Infelizmente, as contribuições públicas dos associados têm sido muito diminutas, neste esforço de discussão responsável, séria e construtiva, do presente e do futuro do FCB.
Manuela Fonseca, dedicada e atenta associada, foi aqui e acolá esboçando algumas preocupações, nomeadamente num belo texto publicado a 18 de Novembro de 2005, quando a nossa equipa de futebol, a disputar pela segunda vez no seu historial a Divisão de Honra, se encontrava já então perigosamente nos últimos lugares da tabela classificativa.
Em Rostos entendi nesse mesmo dia responder-lhe da forma que se segue:

Lutar pelo Barreirense… sempre!
Chorar por Ele… às vezes

Cara Manuela Fonseca:
A leitura das suas belas e sentidas palavras (“Carta a Rui Bento” em Rostos de 18 de Novembro de 2005) estimulou-me o desejo de lhe endereçar este texto, pelo muito apreço e admiração que sinto por si.
De há muito conhecido, o seu fervor Barreirense traduziu-se desta vez, num apelo muito oportuno e sincero, à confiança dos nossos consócios no devir da equipa sénior de futebol que disputa a Liga de Honra. No momento difícil que vivemos, nas vertentes desportiva e financeira, temos a suprema responsabilidade de, enquanto associados deste histórico, sério e prestigiado clube, reforçar a sua memória colectiva, enaltecer o seu papel sócio-desportivo-cultural, preservar a sua unidade, acreditar no seu inegável potencial de afirmação e crescimento.
O presente do Desporto em Portugal revela-nos uma realidade dolorosa, que parece apenas agora começar a ser devidamente assumida e consciencializada pelos seus protagonistas e responsáveis. A chaga dos salários em atraso no futebol (claramente mais mediatizada) mas também nas outras modalidades de alta competição e a falência recente de Clubes e S.A.D. obrigam a uma reflexão profunda.
A recente venda de algum do património do FC Barreirense, obviamente assumida pelos seus associados em Assembleia-Geral, aliviou, ainda que transitória e temporariamente, a perspectiva eminente de rotura. O encaixe financeiro até agora proporcionado por essa alienação patrimonial assegurou a participação, esta época, nas competições profissionais das duas modalidades mais representativas, o Futebol e o Basquetebol, e a prossecução da nossa vocação de Clube Formador, apesar das escassas e obsoletas infra-estruturas disponíveis.
A concretização dos resultados e objectivos competitivos que ambicionamos e que motivaram a escolha criteriosa de equipas técnicas, atletas, etc., são certamente fundamentais para o sucesso deste projecto desportivo. Mas importa, em minha opinião, ir mais longe. Temos, os Barreirenses, todos os Barreirenses, que repensar o nosso querido FC Barreirense, solidificar a sua matriz identitária, consolidar a sua inserção no tecido empresarial e cultural da Cidade e do Concelho do Barreiro. Será, certamente, um processo árduo e complexo, mas de urgência e alcance indiscutíveis, sem o qual correremos o risco de comprometer e alienar o nosso futuro.
A Manuela Fonseca estará, seguramente, na linha da frente dessa reflexão que aqui e agora proponho. O Desafio está lançado. Mãos à obra.
Cumprimentos,
Paulo Calhau

[Fim do Capítulo II - Servir
Livro PROVA DeVIDA - Estórias e memórias do meu Barreirense]
(continua)